Achei aqui nos meus arquivos nossa participação em uma matéria da Patrícia Santos Dumont, para o Hoje em Dia, publicada no dia 03/02/2019. Resolvi compartilhar ela aqui para você!
Bendita fumaça: defumação é carta na manga de chefs para obter novos sabores e texturas
Técnica desenvolvida há séculos para ajudar na conservação de alimentos, a defumação é usada na culinária atual como estratégia para modificar textura e sabor de forma sutil. Em restaurantes, com equipamentos específicos, ou em casa, de maneira artesanal, o processo, que envolve fonte de calor, temperos e especiarias, produz um gostinho especial em receitas salgadas e até em doces.
Professora de culinária, sócia na Experimente Cozinha – Food Lab, em Belo Horizonte, Sabrina Gomide diz que o processo é mais que um método de cocção, uma vez que pode ser executado também a frio. Segundo ela, qualquer alimento pode ser defumado e não somente carnes – mais comuns. O segredo é definir que características serão alteradas para, então, escolher uma das variações da técnica.
“No restaurante do chef Claude Troisgros, por exemplo, com quem trabalhei em São Paulo, fazíamos uma manteiga defumada deliciosa. Aromatizada pela fumaça, era usada em diversos pratos, como peixes, e até para passar no pão. Existem milhões de possibilidades e utilidades. A defumação muda as características organolépticas do prato”, explica.
De olho no tempo
Para garantir um processo correto e assegurar qualidade ao prato, a dica da cozinheira é ter atenção às características do alimento usado e à combinação entre o que se espera dele e o tempo que ficará sob defumação. Peixes, por exemplo, que são mais delicados, não devem ser submetidos a temperaturas muito altas nem a longos períodos em contato com a fumaça, pois podem perder suculência. A frio, o cuidado maior é com o sabor.
“O principal é prestar atenção na espessura do que está sendo feito para que não passe do ponto nem fique amargo ou ressecado. No caso da defumação a frio, a perda de textura não é tão relevante, mas vale caprichar nas especiarias”, ensina.
À frente da cozinha do restaurante Vecchio Sogno, na capital, o chef Ivo Faria utiliza a técnica para conferir mais sabor ao salmão servido em lâminas – aspecto semelhante ao de sushi. Temperado até 24 horas antes de ser defumado, o peixe é colocado em estufa com a fonte de calor e gelo, cujo objetivo é fazer com que a fumaça chegue fria à peça.
O resultado, explica o chef, é um peixe semi-defumado, com textura preservada e sabor mais presente, porém suave. “Justamente por não ser defumado por completo, como bacon e linguiça, o sabor é leve, mas não tanto quanto o do sushi”, detalha.
Mudanças pontuais
Sob o “calor” da fumaça, o pescado permanece por cerca de cinco horas. Esse tempo, no entanto, pode variar para mais ou menos, conforme a espessura do filé utilizado. De acordo com Ivo Faria, o objetivo é promover mudanças pontuais no sabor dos alimentos, mas não modificá-los por completo.
Restaurante com duas unidades, em Belo Horizonte e Nova Lima, o OssO Mind The Bones lançou mão da fumaça temperada para dar um toque especial a uma sobremesa. Velho conhecido de muita gente, o churros de paçoca com doce de leite por lá é servido defumado.
Empresário de BH usa técnica e forno especiais há 45 anos
Uma ciência exata. É como o proprietário da Salumeria Chiari, Carlos Chiari, define o processo de defumação feito por ele da mesma maneira, há 45 anos, em Belo Horizonte. Segundo o descendente de italianos – que produz sete carnes diferentes, dentre cortes suínos e bovinos, utilizando a técnica em forno artesanal –, é necessário precisão para garantir o produto perfeito.
A temperatura do fogo – 75°C – é crucial para o resultado obtido. Acima disso, corre-se o risco de cozinhar demais o produto e fazer com que perca umidade. Abaixo, o perigo é o de não pasteurizar a carne, deixando-a suscetível a bactérias. “A carne pode estar linda por fora, mas contaminada por dentro”, justifica Chiari, ensinando que manchas brancas no produto são sinal de defumação não uniforme.
Detalhes
Tipo e quantidade de tempero, uso de ervas aromáticas e modo de embalar o corte também integram o passo a passo, cuidadoso do início do afim. Até o tipo de madeira influencia, é preciso que garanta fumaça abundante e constante. No caso dos produtos feitos por ele – copa, lombo, presunto pata branca, pastrame, picanha e os mais recentes, speck e pustanhac –, a escolha é o eucalipto.
“É uma madeira ecologicamente correta, desenvolvida para virar lenha. Só preciso tirar a casca, para não deixar o produto escuro, e as folhas, para não virar sauna”, brinca Carlos Chiari, ou somente Chiari, como é conhecido em BH.
Diferentes no corte, na apresentação, no tempo de defumação e nas ervas que levam durante o processo, as carnes apresentam sabor bem específico, mas discreto. “Não são enfumaçadas, mas defumadas”, reforça o empresário.
TRADIÇÃO – Chiari mantém o mesmo processo, feito em forno (ao fundo) criado por ele há 45 anos, em sete produtos diferentes
RECEITA:
Pudim de leite defumado:
– Ingredientes:
2 latas de leite condensado
2 latas de leite (mesma medida do leite condensado)
6 ovos
2 xícaras de chá de açúcar
3/4 xícara de chá de água
– Modo de preparo:
Faça uma cama de serragem (numa assadeira) e posicione o leite e o leite condensado no meio dela em um bowl pequeno. Acenda o fogo, espere liberar fumaça e tampe. Aguarde por cerca de 10 minutos.
Bata no liquidificador os ovos com o leite condensado.
Em uma panela, coloque o açúcar e a água e misture até dissolver. Cozinhe até que fique com cor de caramelo. Transfira para uma forma e espalhe por toda a superfície.
Adicione o creme batido e cubra com papel alumínio. Leve ao banho maria e asse por aproximadamente 1 hora e meia em fogo baixo (160°C). Espere esfriar para desenformar!
Dica: frutas como abacaxi e banana podem ser defumadas no forno (veja passo a passo abaixo). Aproveite para combiná-las com o leite condensado defumado!
Além disso:
– Passo a passo da professora Sabrina Gomide para defumar alimentos em casa:
1º Coloque gravetos secos ou serragem comprada em loja de produtos naturais em uma assadeira forrada com papel alumínio. Acrescente ervas à sua escolha ou especiarias como cravo e canela em pau combinando os temperos com o alimento que será defumado
2º Leve-a à grade inferior do forno ligado a 250°C. Deixe fechado por pelo menos 10 minutos até que aqueça e comece a liberar fumaça
3º Coloque o alimento a ser defumado diretamente na grade superior, acima da usada para acomodar a serragem. Se quiser, use papel alumínio como suporte
4° Mantenha o alimento no forno por cerca de 5 minutos. Vire e deixe defumando pelo mesmo tempo. Atenção: vegetais ganham sabor mais rápido que carnes
5º Retire a assadeira com a madeira e termine a cocção do alimento no forno. Observação: a temperatura do forno também deve variar conforme o alimento
– Quer defumar legumes como abobrinha e cenoura, por exemplo, mas não deseja cozinhá-los? Experimente o processo feito a frio:
Separe duas latas de tamanhos diferentes – 1 litro e 500 ml, por exemplo. Na menor, coloque a serragem e leve-a ao fogo médio. Faça um furo pequeno no centro da lata menor e encaixe-a na maior. Assim que começar a produzir fumaça, insira um canudinho no furo da lata pequena e encaixe-o, em seguida, num saquinho zip-loc com o alimento já acondicionado. Quando conseguir fumaça suficiente para preencher o saquinho, leve-o à geladeira.
SEM MISTÉRIO – Técnica pode ser feita em casa com papel alumínio, serragem e ervas aromáticas, ensina professora de culinária Sabrina Gomide, da Experimente Cozinha – Food Lab, em BH
Fonte: http://hoje.vc/294-5